Tarifas, juros e demissões: Suprema Corte dos EUA vai redefinir poderes de TrumpTarifas, juros e demissões: Suprema Corte dos EUA vai redefinir poderes de Trump
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A Suprema Corte dos Estados Unidos iniciou nesta segunda-feira (6) seu novo mandato com uma pauta já repleta de casos significativos e que podem definir o alcance da autoridade presidencial de Donald Trump — com a perspectiva de que mais processos cheguem à Corte em breve.
Nos oito meses desde que Trump retornou à Casa Branca, ele tem testado os limites do poder Executivo, implementando novas políticas de forma unilateral, reduzindo orçamentos e o quadro de funcionários federais e tentando trazer agências e instituições anteriormente independentes para sob seu controle direto.
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A mais recente disputa jurídica surge das tentativas do presidente de assumir o controle das unidades da Guarda Nacional dos Estados e enviá-las a cidades onde ele alega haver desordem pública e criminalidade desenfreada, contrariando autoridades locais e estaduais.
Em Oregon, uma juíza federal emitiu ordens bloqueando o envio de tropas de Trump a Portland. Um tribunal de apelações deve revisar a medida nos próximos dias.
“Esta é uma nação de leis constitucionais, não de lei marcial”, escreveu a juíza Karin Immergut, nomeada por Trump em seu primeiro mandato, em sua decisão publicada no sábado.
“Os réus apresentaram uma série de argumentos que, se aceitos, correm o risco de confundir a linha que separa o poder civil do poder militar federal — em detrimento desta nação.”
Assim que o tribunal de apelações emitir sua decisão, a Suprema Corte poderá intervir por meio de seu chamado shadow docket [ou “processo sombra”, em tradução livre, que descreve a prática da Corte de emitir decisões e ordens emergenciais de forma acelerada, sem o processo habitual de argumentação oral], publicando uma decisão que pode restringir a capacidade de Trump de usar o Exército em solo americano — ou conceder ao presidente liberdade total, ao menos temporariamente.
Esse tipo de revisão se tornou mais frequente recentemente, já que a maioria dos juízes da Suprema Corte, ao responder a petições de emergência apresentadas pelo governo Trump, tem permitido que as ações do presidente avancem enquanto as disputas legais seguem tramitando.
“Um cabo de guerra entre a Suprema Corte e os tribunais federais inferiores será uma força motriz no próximo mandato”, afirmou Samuel Bray, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Chicago, em um pronunciamento no mês passado.
Nos próximos meses, contudo, a Suprema Corte deve enfrentar questões sobre o poder presidencial
REUTERS/Kevin Mohatt via BBC
Cabo de guerra
O uso frequente desse shadow docket tem sido criticado por juristas e políticos de tendência progressista, que consideram a prática um uso indevido da autoridade do tribunal.
As decisões costumam ser curtas, oferecendo pouca fundamentação jurídica e deixando juízes de instâncias inferiores sem orientação clara.
“Todos os americanos deveriam estar alarmados com a crescente dependência da Suprema Corte de seu shadow docket para resolver casos controversos e de alto perfil sem transparência — sem explicações substantivas, sem argumentos orais, sem justificativas”, afirmou o senador democrata Cory Booker, de Nova Jersey, no início deste ano.
“Isso empurra ainda mais as deliberações e decisões da Corte para fora do escrutínio público, blindando-a contra a responsabilização.”
Nos próximos meses, contudo, a Suprema Corte deve enfrentar questões sobre o poder presidencial — e outras controvérsias de grande repercussão — ouvindo argumentos orais e emitindo decisões completas sobre o mérito dos casos.
“Ela não vai poder se safar com ordens de uma página que não explicam o raciocínio”, disse Maya Sen, professora da Escola Kennedy de Harvard, especialista em Suprema Corte e política dos EUA. “Se for conceder mais poder ao Executivo, terá que explicar por quê.”
A Corte já programou a análise de se leis federais que impedem o presidente de demitir membros de agências concebidas pelo Congresso para serem independentes violam a autoridade executiva.
Os juízes também ouvirão argumentos em uma revisão acelerada da tentativa de Trump de demitir Lisa Cook de seu cargo como diretora do influente Conselho do Federal Reserve — um caso que pode ampliar dramaticamente o poder do presidente sobre a política econômica americana.
A economia dos EUA — e a global — também estará no centro das atenções, já que os juízes da Suprema Corte terão a oportunidade de decidir se muitas das tarifas sobre importações estrangeiras impostas unilateralmente por Trump têm respaldo legal suficiente ou devem ser anuladas.
Os magistrados também podem revisar as tentativas de Trump de reduzir unilateralmente os gastos federais e demitir funcionários públicos de escalões inferiores, assim como suas políticas agressivas de imigração e deportação.
Embora a Corte ainda não tenha concordado em analisar a tentativa de Trump de acabar com a cidadania automática para pessoas nascidas em solo americano, isso pode acontecer nos próximos meses.
“O alcance do poder executivo será o foco central deste mandato”, afirmou a professora Jennifer Nou, da Faculdade de Direito da Universidade de Chicago, em e-mail à BBC.
“Os casos que chegam à Corte testarão as prioridades políticas e econômicas mais altas do governo Trump — sejam as tarifas ou o direito à cidadania por nascimento.
“Uma das questões será se os juízes aplicarão os mesmos princípios (como a doutrina das ‘grandes questões’) usados para derrubar iniciativas emblemáticas de Biden de forma politicamente equilibrada.”
A Corte utilizou recentemente essa “doutrina das grandes questões” para impedir os esforços de Biden na anistia de dívidas estudantis e na regulamentação ambiental, argumentando que o Congresso não lhe havia concedido autorização explícita para isso.
O poder presidencial é o foco central do mandato da Suprema Corte neste ano, mas também estão agendados casos que envolvem várias polêmicas políticas e culturais de grande destaque.
O tribunal analisará se uma proibição no Colorado da terapia de conversão — prática controversa que busca, por meio de aconselhamento, mudar a orientação sexual ou identidade de gênero de uma pessoa — viola as proteções constitucionais à liberdade de expressão.
Também estão na pauta dois casos envolvendo proibições estaduais à participação de atletas transgêneros em competições esportivas escolares.
Um deputado republicano de Illinois contesta uma lei estadual que permite contar votos enviados pelo correio até duas semanas após o dia da eleição.
Um grupo de conservadores da Louisiana pediu à Corte que derrube uma disposição da lei dos direitos de voto que obriga os Estados a desenhar distritos eleitorais que garantam representação proporcional de eleitores negros.
E o Partido Republicano tenta revogar uma lei de décadas que impede candidatos e partidos políticos de coordenar seus gastos de campanha.
Nos últimos anos, esta Suprema Corte, de maioria conservadora, demonstrou disposição em emitir decisões históricas que alteraram profundamente o panorama jurídico dos Estados Unidos.
Em temas como o direito ao aborto, a autoridade regulatória federal e a consideração de raça nos processos de admissão universitária, a Corte reverteu precedentes consolidados por décadas.
Essas decisões contribuíram para uma percepção pública da Suprema Corte cada vez mais polarizada ao longo de linhas partidárias.
Em uma pesquisa recente da Fundação Pew, as opiniões sobre a mais alta instância jurídica do país estavam quase igualmente divididas — com republicanos em geral favoráveis e democratas fortemente críticos.
Até o momento em que a Corte emitir suas decisões finais neste mandato, previsto para o fim de junho do próximo ano, a maioria conservadora de 6 a 3 poderá ter aberto novos caminhos — e mais uma vez, transformado fundamentalmente o direito americano.
A mais alta corte dos EUA vai se pronunciar sobre as tentativas de Trump de expandir o poder presidencial
Getty Images via BBC

By Marsescritor

MARSESCRITOR tem formação em Letras, é também escritor com 10 livros publicados.