O São Pedro que virou cinzas – 19/07/2023 – São Paulo Antiga

O Brasil infelizmente nunca foi uma grande referência quando o assunto é preservação de patrimônio artístico, obras de arte, e acervos em geral. Prova disso são os costumeiros incêndios em que museus, cinematecas e instituições culturais são vítimas, geralmente devido à negligência na manutenção preventiva ou do mal acondicionamento de bens culturais. E foi desta maneira negligente que uma escultura gigantesca, produzida sob intenções igualmente grandiosas acabou não apenas esquecida pelo tempo como também transformada em cinzas: O São Pedro de Mestre Agenor.
O INÍCIO
No final de década de 1960 o escultor baiano Agenor Francisco dos Santos (Alagoinhas 14/5/1932) dono de um dom incrível, já que nunca frequentou escolas e seu talento artístico desenvolveu-se naturalmente, propôs ao então prefeito de São Caetano do Sul (SP), Walter Braido, a ideia de produzir uma escultura de São Pedro Apóstolo para presentear o Papa Paulo VI. A ideia foi encampada por Braido que deu sinal verde e verba ao artista para iniciar os trabalhos em 1968.
Especialista em esculpir na madeira, Mestre Agenor idealizou uma escultura de dimensões grandiosas tal qual o Borba Gato de Santo Amaro que, inaugurado em 1963, chamava a atenção dos paulistanos tanto pelo tamanho incomum quanto pelo estilo controverso. Para tanto encomendou um tronco de peroba na cidade paranaense de Cianorte, cuja jornada para levá-la até São Caetano foi uma grande movimentação logística, já que o objeto media 12,20 metros de altura e pesava 31 toneladas.
Uma vez entregue o tronco Agenor Francisco dos Santos iniciou seus trabalhos, em um projeto que demorou cerca de dez meses e custou 30 mil cruzeiros da época para ficar pronto. Todos os trabalhos foram realizados em um galpão montado na avenida Goiás, em São Caetano, especialmente para o artista.
Contudo com a obra concluída ocorreu um problema que provavelmente selou seu futuro funesto. O Vaticano recusou o presente ofertado alegando que os custos para o transporte até seu destino, na praça São Pedro, eram extremamente altos. No noticiário da época houve quem garantisse que o real motivo para a Santa Sé recusar o mimo era o estilo da escultura, que não teria agradado os conservadores da cúpula da igreja. Essa história, no entanto, nunca foi confirmada.
A negativa do Vaticano trouxe um problema de 12 metros de altura para São Caetano do Sul, que não vislumbrava em um primeiro momento o que fazer com a peça. Walter Braido já não estava mais na prefeitura e o novo prefeito resolveu ceder a escultura para a capital paulista, de modo que ficasse exposto em outra Sé, a nossa praça da Sé.
A escultura de São Pedro ficou exposta por alguns meses diante da Catedral Metropolitana de São Paulo, bem próximo ao marco zero de São Paulo, onde ficou diante do olhar dos milhares de paulistanos que diariamente passavam pelo local. Como a exposição da peça ali era provisória, foi posteriormente removida e deixada em um depósito da prefeitura paulistana onde ficou esquecida por alguns anos até ser recuperada, em 1975, por Walter Braido que novamente era o prefeito de São Caetano do Sul.
Resgatada, faltava um lugar que pudesse receber a grandiosa escultura e o local escolhido foi o jardim da Universidade Municipal de São Caetano do Sul, para onde ela foi transportada e ficou exposta por aproximadamente três décadas, tendo apenas sido removida entre 1991 e 1996 durante obras realizadas no campus.
O FIM
Exposta no jardim sem muitos cuidados de manutenção preventiva, algo infelizmente corriqueiro na preservação de obras artísticas no Brasil, a escultura sofreu uma grande infestação de cupins e em 2006 foi removida novamente do local pois corria risco de queda. Foi guardada em um depósito e completamente esquecida por anos a fio sem qualquer manutenção, o que levou em 2013 a triste decisão de incinerar a escultura, já que oferecia risco a outras estruturas. Pouco mais de 4 décadas após sua criação, amargou um triste fim e virou cinzas.
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