Premiê da França cai após derrota no Parlamento e aumenta crise no governo Macron
François Bayrou, nomeado por Macron primeiro-ministro da França, em agosto de 2024.
Dimitar Dilkoff/ AFP
O primeiro-ministro da França, François Bayrou, perdeu o voto de confiança do Parlamento nesta segunda-feira (8), aprofundando a crise política do governo Macron.
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Após Bayrou não conseguir aprovar o orçamento do governo francês para 2026, 364 parlamentares votaram contra ele e 194 a seu favor.
Sua queda vem na esteira de uma instabilidade política e econômica da França – ele foi a quarta pessoa a ocupar o cargo de primeiro-ministro francês nos últimos dois anos. Seu antecessor, Michel Barnier, caiu pela mesma razão.
A queda do premiê, que cuida da política interna francesa, mergulha a 2ª maior economia da zona do Euro em uma paralisia política e econômica ainda mais profunda. Após a votação, o gabinete de Bayrou afirmou que ele apresentará sua renúncia ao presidente francês, Emmanuel Macron, na manhã de terça-feira.
Ainda não está claro se o presidente francês, Emmanuel Macron, dissolverá o Parlamento para convocar novas eleições. Macron poderia também renunciar, o que disse que não vai fazer, ou tentar formar uma nova coalizão minoritária de governo. O Palácio Eliseu anunciou que Macron nomeará o sucessor de Bayrou “nos próximos dias”.
Ao insistir em cortes de € 44 bilhões (cerca de R$ 280,8 bi) para o orçamento de 2026, Bayrou recebeu críticas de todos os lados: a esquerda denunciou um plano de “austeridade”, que a extrema direita considerou “injusto”. Macron herdará o problema de encontrar mais uma vez um novo chefe de governo capaz de conduzir uma proposta de orçamento que passe pelo Parlamento.
As tensões sociais também estão em alta na França. Vários grupos nebulosos surgidos online convocaram os franceses a “parar tudo” nesta quarta-feira, enquanto os sindicatos tradicionais planejam uma mobilização em 18 de setembro contra os planos de cortes orçamentários.
Em discurso antes da votação, o premiê se defendeu e pediu união para encarar desafios do país como a necessidade de controle dos gastos:
“Membros do Parlamento, vocês têm o poder de derrubar o governo, mas não têm o poder de apagar a realidade. A questão vital, a questão de vida ou morte, onde nossa própria sobrevivência está em jogo… é a questão de controlar nossos gastos, é a questão do superendividamento. Nosso país tem uma necessidade urgente de lucidez, tem a necessidade mais urgente de unidade. Mas é a divisão que ameaça prevalecer, que ameaça sua imagem e reputação”.
A líder da extrema direita na Assembleia Nacional, Marine Le Pen, fez duras críticas a Bayrou e também a Macron, e afirmou que o “poder legislativo está paralisado pela falta de maioria”.
“É uma época em que os responsáveis ​​são forçados a revelar os resultados desastrosos de cinco décadas de gestão perdulária. O lamentável espetáculo de um colapso para o país, um desastre para o povo francês. As consequências afetarão as gerações futuras da nação. O país vive uma crise social latente que pode eclodir a qualquer momento”, disse Le Pen.
Boris Vallaud, presidente do Partido Socialista, também atacou Macron: “Só há uma pessoa responsável pela crise, pelo desastre e pela agitação no nosso país: o presidente da república e seus seguidores cegos, dos quais você, primeiro-ministro, é o principal defensor”.
A queda do governo minoritário encabeçado pelo premiê Bayrou agrava os problemas da França também em um momento considerado crítico para a Europa, que busca unidade diante da guerra da Rússia contra a Ucrânia, de uma China cada vez mais dominante e de tensões comerciais com os Estados Unidos.
A turbulência política também ameaça a capacidade da França de controlar sua dívida, com o risco de novos rebaixamentos de crédito à medida que cai a confiabilidade do mercado no país. Ainda não se sabe como a situação interna da França impactará no restante do bloco europeu.
A França enfrenta forte pressão para consertar suas finanças: no ano passado, o déficit foi quase o dobro do limite de 3% do PIB estabelecido pela União Europeia, e a dívida pública atingiu 113,9% do PIB.
“Quero dizer como estou feliz que o governo vá cair hoje. Para muitos franceses, é um alívio”, disse Manuel Bompard, da França Insubmissa, de extrema-esquerda, à emissora “Franceinfo”. Membros da oposição de todo o espectro político também haviam dado declarações de que derrubariam Bayrou e que isso faria bem ao país.
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Presidente da França, Emmanuel Macron
REUTERS/Christian Hartmann
Macron descartou, até agora, dissolver o Parlamento, como fez no ano passado. A França está mergulhada em crise política desde a eleição antecipada que colocou Bayrou no poder. À época, o resultado da votação constituiu um Parlamento ainda mais dividido.
A aliança de Macron, que já havia perdido a maioria desde 2022, encolheu ainda mais, enquanto o Reagrupamento Nacional (de extrema-direita) se tornou o maior partido. Uma coalizão frouxa de partidos de esquerda, agora profundamente dividida, ficou com o maior bloco, mas nenhum campo tem maioria.
Especialistas concordam que uma segunda dissolução da Assembleia Nacional não seria uma boa ideia, porque “poderia resultar em uma maioria absoluta do partido Reunião Nacional”, de extrema direita, uma vez que “o centro perde força”, afirmou o especialista em Direito Constitucional Benjamin Morel, em entrevista ao jornal francês “Libération”.
“Essa crise foi provocada e alimentada pelo presidente Emmanuel Macron e todos aqueles que o serviram”, disse no domingo Marine Le Pen, líder da bancada do Reagrupamento Nacional. “Hoje, o homem doente da Europa, por causa deles, é a França.”
A escolha de um governo técnico pode ser uma alternativa, mas ela “diminui o engajamento dos partidos políticos” na decisão do orçamento e das políticas públicas, segundo Morel.
Após a queda de um conservador e de um centrista no cargo de primeiro-ministro, muitos analistas esperam que Macron busque agora um candidato entre as fileiras dos socialistas (PS, centro-esquerda).
Qualquer candidato desse perfil enfrentaria enormes desafios e ainda teria de construir uma delicada aliança com o bloco liberal do presidente, que se opõe a muitas ideias da esquerda, como o aumento de impostos para os mais ricos a fim de cobrir o rombo nas contas públicas. Também precisaria convencer a direita moderada a tolerar mais um governo minoritário.
Laurent Wauquiez, líder parlamentar dos conservadores Les Républicains (LR), sinalizou que não pediria a queda de um primeiro-ministro socialista. Mas o presidente do partido e ministro do Interior, Bruno Retailleau, discordou. “Não há chance de aceitarmos um primeiro-ministro socialista”, disse Retailleau.
O jornal “Le Monde” compara o “suicídio” político de Bayrou à dissolução da Assembleia, há mais de um ano pelo presidente Emmanuel Macron, para exigir “uma clarificação” dos franceses sobre o avanço dos extremistas no cenário político. O diário destaca a determinação do premiê em “mostrar a verdade” para os franceses sobre o endividamento do Estado, mesmo que isso lhe custe a própria demissão.
Segundo o jornal “Le Figaro”, Bayrou caiu porque foi incapaz de governar e disse que o premiê não teve a capacidade necessária para articular.
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By Marsescritor

MARSESCRITOR tem formação em Letras, é também escritor com 10 livros publicados.